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Quando ser pequena já não basta

Há um instante na jornada em que o corpo começa a se alongar para um espaço maior, não o corpo físico, mas aquele que abriga a alma. É um momento silencioso, quase imperceptível, em que as antigas formas de se encolher já não servem, e as palavras que antes protegiam agora parecem amarras. É quando ser pequena já não basta.

Por muito tempo, ser pequena foi uma forma de existir com segurança. A pequenez cabia nas expectativas dos outros, nas demandas discretas da infância, nas relações onde o amor vinha misturado ao medo de desaparecer. Ser pequena garantia aprovação. Garantia cuidado. Mas também, sutilmente, impedia o florescimento.


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O espelho que nos devolve inteiros

Winnicott, em seus estudos sobre o desenvolvimento emocional, dizia que nos tornamos reais quando somos vistos, quando o olhar do outro nos reconhece como alguém inteiro, não como uma extensão de expectativas. Essa experiência de “ser olhada” de forma suficientemente boa é o que inaugura o sentimento de existir.

Mas, quando essa imagem não é devolvida com verdade, quando o olhar vem distorcido, ausente ou exigente demais, crescemos aprendendo a ser menos do que somos. A pequenez, então, vira um modo de sobrevivência psíquica. O medo de brilhar nasce da dor de um olhar que, um dia, talvez não tenha suportado a nossa luz.

A psicanálise nos ensina que o “eu” se constrói nesse espelho. E o amadurecimento, por sua vez, é o processo de reconstituir essa imagem, de encontrar dentro de si o olhar que sustenta, o colo que antes se buscava fora. Ser grande, nesse sentido, é uma conquista silenciosa: é deixar de se ver com os olhos do trauma e começar a se ver com os olhos da alma.

A coragem de habitar a própria grandeza

Jung chamava esse processo de individuação: o caminho de tornar-se quem se é, integrando luz e sombra, potência e limite. (falaremos mais sobre isto em outro post) É um chamado para assumir a própria forma no mundo, sem o medo de não caber. E há um tipo de dor que acompanha esse despertar, a dor de abandonar a versão que um dia foi necessária para sobreviver.

Bion dizia que crescer emocionalmente implica suportar a frustração de perder as antigas certezas. Ser grande exige suportar o desconforto da expansão: o ego quer previsibilidade, mas a alma pede movimento. E quando o movimento é negado, o corpo começa a dar sinais, inquietação, cansaço, sensação de sufoco. Não é fraqueza. É o chamado da vida pedindo espaço para florescer.

O luxo de pertencer a si

Há um tipo de luxo que não se compra: o de pertencer a si mesma. Reconhecer-se grande não é arrogância, é gratidão. É entender que a mesma força que um dia sustentou o medo agora sustenta a fé. É honrar a trajetória que te trouxe até aqui, e compreender que maturidade não é o fim da fragilidade, mas a convivência pacífica entre força e sensibilidade.

A mulher que se reconhece grande não precisa mais provar. Ela apenas habita; o corpo, o tempo, o silêncio. Ela aprende a responder menos e a sentir mais. Não busca palco, busca presença. E essa presença, quando chega, muda o ar do lugar onde pisa.

A metáfora da origem

Há algo de sagrado em reconhecer-se grande. Não pela medida que o mundo usa; títulos, sucesso, controle; mas pela consciência de que há algo divino pulsando no simples ato de existir. Como se cada partícula de luz fosse um lembrete de origem: viemos de um lugar de grandeza, e é para lá que, silenciosamente, retornamos cada vez que ousamos ser inteiras.

Talvez essa seja a verdadeira redenção, não se tornar mais do que somos, mas, enfim, nos permitir ser tudo o que fomos criadas para ser.

Porque há um tempo em que ser pequena protege. Mas chega um tempo em que ser pequena adoece. E é nesse limiar entre o medo e o chamado que Deus sussurra á alma: - Agora, filha, é hora de caber em você. Selah. Por Fernanda Gregório Fonseca --------- Referências

  • Meus pensamentos E também...

  • Winnicott, D. W. (1965). The Maturational Processes and the Facilitating Environment. London: Hogarth Press.

  • Jung, C. G. (1951). Aion: Researches into the Phenomenology of the Self. Princeton University Press.

  • Bion, W. R. (1962). Learning from Experience. London: Heinemann.

 
 
 

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